Cura Crística

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

OS VELHOS SAPATOS DE UM MONGE








Eu escolhi ser monge muito cedo, porque Eu não acreditava muito na vida, porque não tive muitas escolhas, porque a vida no mundo externo não Me agradava. Era uma vida conflituosa, era uma vida com dificuldade e na Minha ingenuidade achei que se me tornasse um monge me livraria dos problemas, porque acreditei que uma vida dedicada ao caminho espiritual fosse ser uma vida leve, uma vida sem conflitos, uma vida de pessoas boas, uma vida de convivência com almas iluminadas como a Minha. Imaginei que seria um caminho muito bom com companheiros, com relacionamentos afetuosos, uma vida longe das disputas afetuosas do mundo material. Uma vida longe da inveja, da raiva, da necessidade de ganhar dinheiro, de conquistas de fama.

Imaginei que no monastério Eu iria encontrar a paz e quanta paz Eu tive de buscar na Minha mente, quando durante dois anos Me entregavam um balde e um esfregão. Os outros monges todos meditando, estudando ou cumprindo a sua missão e Eu esfregando o chão.

Nos Meus delírios, nas Minhas rezas, nas Minhas orações, pensei assim: -“Puxa Eu não mereço, devo ser uma alma muito, muito má pra esfregar o chão; só esfregar o chão...”.

Para os Meus superiores Eu não falava nada, porque imaginei que eles soubessem tudo que Eu pensava e que um dia também tivessem esfregado o chão e ali fiquei... Dois longos anos esfregando o chão sonhando, imaginando como devia ser linda a meditação daqueles Meus colegas mais velhos que ficavam em suas celas em silêncio meditando, meditando, meditando. Deviam ter experiências cósmicas maravilhosas. Quantas vezes imaginei como a vida deles devia ser. Uma vida linda, uma vida de almas iluminadas, uma vida de quem sabia tudo e quanto mais eu achava que eles sabiam tudo, mais Eu descobria que não sabia nada, porque Eu tinha que esfregar o chão.

Quando Eu fui chamado pra receber uma premiação, era o Meu momento de mudança, eles Me colocaram na horta... E aí foram mais cinco anos cuidando da horta. Todos os dias, enquanto os monges passavam por mim e Me cumprimentavam, sorriam, Eu dizia assim: -“Meu Deus, o único que Eu posso olhar pra trás é aquele coitado que agora lava o chão e que agora não Sou mais Eu, porque agora Sou jardineiro”.

Assim fui cuidando da horta e ali tive vários colegas, vários amigos e briguei muito, porque cada um fazia de um jeito. Às vezes Eu plantava de um lado e outro replantava do outro e uma planta brigava com a outra, porque elas não eram compatíveis...

Quantas experiências Eu tive mexendo na terra, mas Eu sonhava, sonhava, sonhava e sonhava com a vida espiritual, porque aquilo não era vida espiritual. Mexer na terra não era vida espiritual. Cuidar de alimentar as pessoas não era vida espiritual, pelo menos pra Mim não era. Aquilo era um trabalho humano, aquilo era um trabalho braçal, aquilo era um trabalho que qualquer pessoa podia desenvolver. Não era um trabalho espiritual e ali Eu fiquei cinco longos anos da Minha vida trabalhando muito, com dores nas costas, às vezes na chuva, às vezes no sol, tendo que conversar com as pessoas, ganhar o Meu espaço, porque Eu tinha a intenção de plantar as ervas, as plantas de um determinado jeito e as pessoas que estavam do Meu lado não aceitavam, então foi difícil, foram anos de luta, disputa de poder; poder pela terra, poder pela salsinha.

Assim foram anos da Minha vida, lutando, Me esforçando num trabalho humano e muitas vezes Eu pensei: -“Meu Deus, Eu que vim pro monastério Estou aqui plantando salsinhas, tomates, batatas e pimentões; vendo se faz sol, se faz frio, Me preocupando com o tempo, com o vento, com a falta de chuva ou com o excesso dela... Cadê o Meu trabalho espiritual? Trabalhos espirituais fazem aqueles monges que ficam nas celas trancados, fechados, orando. Eles devem entrar em transes maravilhosos, em situações de ver Deus e com certeza eles vêem Deus e o único Deus que Eu vejo é o coelho que subiu na terra e comeu as Minhas plantações, são as pragas, são as pessoas que estão aqui do Meu lado e não Me deixam fazer o trabalho direito”.

Como tempo Eu comecei a gostar, porque tinha dias em que o jardim estava tão bonito, a horta estava tão linda, tão verde e justamente quando ela estava mais bonita ela seria colhida no dia seguinte e a terra voltaria a ser revolvida e o trabalho recomeçava e Eu pensava: -“Isso não é vida espiritual”.

Recomeçar todos os dias, ter que fazer tudo de novo, ter paciência, limpar as ervas daninhas, dar continuidade, vencer a Minha preguiça, vencer o Meu cansaço, Me dedicar, Me dedicar, Me dedicar às vezes pra não ver nada ou pra ver aquele verde florescer num único dia e no dia seguinte ser arrancado. Isso não é vida espiritual... Trabalhar tanto pra nada... Não, isso não é vida espiritual. Vida espiritual deve ser aqueles monges que vão à caverna e aí comecei a pensar que um dia Eu iria pra caverna; com certeza um dia Eu iria pra caverna, um dia Eu teria coragem de ir pra caverna, porque para ir pra caverna Eu tinha que pedir, Eu tinha que fazer um voto, Eu tinha que procurar o monge responsável e dizer pra ele que Eu queria ir pra caverna, mas Eu não tinha essa coragem e aí Eu pensava: -“Meu Deus, como sou covarde”.

Quando Eu pensei isso, Me colocaram pra pintar as janelas do templo e lá fui Eu. Era um monastério muito grande, com muitas janelas e passei vários anos pintando janelas; anos o suficiente pra perder o medo da altura, porque comecei com muito medo de altura, então eles Me colocaram nas janelas inferiores e ali Eu falei: “Nossa como Eu Sou feliz, protegido”. Naquele momento Me senti muito feliz, muito alegre, porque era protegido.

Eu percebi que as janelas de baixo eram as mais sujas. Ficavam borradas de terra, as pessoas colocavam as mãos. Ali Eu tinha além de pintar, lixar, tirar a tinta velha, porque senão a tinta nova não pegava. E Eu pensava: “Isso não é trabalho espiritual. Trabalho espiritual é uma coisa linda, vem pronta. Trabalhos espirituais fazem os monges das celas, os monges que ficam nas cavernas, esses renunciantes maravilhosos e isso que Eu faço não é renuncia, é um trabalho duro, porque dói Meu braço, tenho que Me esforçar e todo dia Eu tenho que acordar e fazer tudo igual, a mesma rotina, o mesmo exercício, o mesmo esforço e ai quando Eu termino, chove e estraga tudo... O Meu trabalho não é espiritual, porque o trabalho espiritual é perfeito”.

Assim Eu passei anos, anos, anos e anos pintando janelas. Quando Eu acabava a última e queria ver a Minha missão cumprida, queria olhar todo aquele movimento, aquele Meu esforço e dos Meus colegas, apesar de que ali fui mais solitário, Eu queria olhar aquilo e dizer: “Nossa que bonito o trabalho que Eu fiz”. E aí quando Eu Me preparava pra olhar tudo isso, a primeira janela já estava suja, as dobradiças já estavam tortas e tinha de recomeçar tudo de novo e, Eu pensava: “Felizes os monges que fazem o verdadeiro trabalho espiritual nas suas clausuras, que entram nas suas celas, que vão para as cavernas”.

Eu idealizei muito a vida espiritual, idealizei demais a vida espiritual. Idealizei a morte, idealizei a vida, porque Eu não tinha muita coragem de viver.

Hoje Eu sei que vocês, no mundo da matéria enfrentando o que vocês enfrentam, encontrando seus familiares, se desencontrando dos seus familiares, amando as pessoas, desgostando delas e tendo que perdoa-las, hoje Eu vejo que essa é a verdadeira vida espiritual, porque quando Eu fui pra cela e fiquei parado, sentado, Eu entrei num desespero tão grande que Eu não via a hora de sair da meditação, Eu não via a hora de sair daquela condição de silêncio absoluto. Eu precisava das palavras das pessoas, Eu precisava dos movimentos dos olhos, Eu precisava do riso, Eu precisava das Minhas lágrimas e não tinha nada disso, porque Eu estava num momento de silêncio e tinha que respeitar e fazer de conta que estava meditando. Daí Eu pensei: “Meu Deus como Sou ruim, porque deve haver na cela ao lado um monge verdadeiramente espiritual que deve estar fazendo sua meditação e deve estar sofrendo com a reverberação da Minha miséria interior, da Minha confusão interior”.

Hoje Eu percebo que vocês, com seus desafios diários, com seus momentos únicos de meditação, quando naquele momento vocês entregam para Deus e dizem: “Deus eu quero ser um instrumento da sua luz, eu quero fazer o bem para essa pessoa ou Deus eu quero ser o bem na minha vida”, nesse momento vocês meditam, nesse momento vocês se transformam e nesse momento vocês estão muito próximos de Deus.

Nunca menosprezem as suas experiências. Não esperem um lugar sagrado; façam o seu lugar interno ser sagrado, tornem o seu coração um lugar sagrado, torne a sua mente um lugar sagrado, torne o seu espírito uma presença constante em suas vidas com consciência, amor e luz.

Antes de Eu Me tornar Lanto, o Mestre Lanto, o Mestre da sabedoria da Chama Amarela, Eu tive muitas vidas como monge. Vidas felizes, vidas tristes, vidas cômicas, vidas em que as coisas deram certo e em que as coisas deram errado.

Eu digo que Me tornei Lanto, porque Eu aprendi a esperar, Eu aprendi a paciência, Eu aprendi a perdoar, Eu aprendi a olhar as Minhas experiências como experiências importantes e sagradas. Eu aprendi a reconhecer o Meu Eu de luz e é isso que hoje Eu venho falar pra vocês: “Desapeguem-se das coisas antigas e acreditem em vocês mesmos como seres com muita luz, com muito amor, com muita capacidade de se doar”.

Enxerguem essa luz, manifestem essa luz. Essa é a verdadeira espiritualidade. Essa é a única luz real.

Recebam Minhas bênçãos e amor. Eu Estou entre vocês, porque Eu Sou como vocês.

Eu aprendi que a morte e a vida são uma única coisa: Um caminhar eterno e um se transformar todos os dias.

Renasçam de suas luzes. Vivam e sejam o seu sol. Paz.



Canal - Maria Silvia Orlovas.